É bem verdade que a divergência proveniente da subjetividade sempre fez parte da história da humanidade. Na história cristã não é diferente. Desde os primeiros séculos, o cristianismo tem encontrado certas dificuldades na unidade de pensamento no que tange à interpretação da Bíblia Sagrada.
Discussões sobre determinados assuntos sempre foram comuns no desenvolvimento histórico da igreja, no que resultou em pelo menos duas principais divisões e várias subdivisões. A primeira divisão foi entre a igreja ocidental (Católica Romana), e a igreja oriental (Ortodoxa Oriental). A segunda divisão foi na igreja ocidental (Católica Romana) dando origem a um novo seguimento cristão intitulado de protestantismo, motivado pela conhecida reforma promovida por Lutero, Zwinglio e Calvino.
A partir de então os pensamentos foram subdividindo-se cada vez mais, correntes teológicas foram postuladas; calvinistas, calvinistas moderados, ultra-calvinistas, arminianos, pelagianos, semipelagianos e etc. Enfim, essa diversidade teológica chegou ao século XXI, e o pior, com muitas mutações no decorrer dos mais de dois mil anos de história cristã. Mas o que isso nos interessa? Bom, a importância está relacionada ao que diz respeito ao emprego da palavrinha teologia, pois grosso modo refere-se ao estudo do Deus revelado nas escrituras sagradas. Assim tal assunto nos interessa e muito, porque quando falamos de interpretações teológicas, estamos nos referindo a como compreender a Bíblia, que por sua vez remete à forma de como Deus se revela nela, o que vai nos dizer quem de fato é esse Deus. Isso faz toda a diferença, pois como podemos crer, adorar, e servir a um Deus que não conhecemos, ou que não temos uma visão correta acerca d’Ele?
É necessário se ter mais do que algum conhecimento sobre esse Deus, mas sim conhecê-lo tal como Ele se revelou nas escrituras, pois é exigido que seus adoradores o adorem em Espírito e verdade, mas como adorar a um Deus desconhecido?
O pior de tudo, é que muitas pessoas em todos os tempos, e muito mais na atualidade tem adorado a um Deus amplamente incógnito, totalmente desconhecido. Tais pessoas pela ausência de um conhecimento bíblico, ficam à mercê da diversidade de apresentações subjetivas do “suposto Deus da Bíblia”. Isso é muito preocupante, pois como observou A. W. Tozer:
“Não há nada que distorça e deforme mais a alma do que um conceito baixo ou indigno de Deus ¹”.
Desta forma uma multidão tem se convertido ao “deus imaginário” dos pregadores triunfalistas da chamada pós-modernidade, ou elaboram seus próprios deuses segundo os seus corações, (Ez 14). No entanto, numa geração marcada pelo relativismo, pela teologia do processo, isso não é de se admirar.
A hermenêutica a ser usada não é pautada nos recursos histórico gramaticais, pois esta conduzirá ao Deus das escrituras, o Deus único e verdadeiro. Mas quem é que quer saber do Deus das escrituras quando se pode moldar um deus segundo as próprias aspirações?
O recurso hermenêutico utilizado agora é o da “interpretação pessoal”, pois afinal de contas, Deus não tem que ser quem Ele é, mas sim quem eu quero que Ele seja!
Desta forma, a cada dia aumenta ainda mais o número de fábricas de ídolos – “o coração do homem”! Tenho pensado muito sobre o assunto, e este tem me deixado preocupado, pois muitas pessoas que se livraram de suas imagens de escultura, a cada dia dão uma nova forma ao ídolo do seu coração, e pior, acreditando serem verdadeiros cristãos!
Pensando nisso, me dispus a escrever essa singela obra, que tem como objetivo apresentar o único e verdadeiro Deus, o que Era, o que É, e que há de vir, da forma como lhe aprouve se revelar na Sua palavra a nós pecadores, pois não há outro meio infalível de Sua revelação a não ser a Bíblia Sagrada.
Meu intuito em produzir esta literatura é levar aos queridos leitores a se posicionarem como o reformador João Calvino:
[...] “A mente piedosa não sonha para si um Deus qualquer; ao contrário, contempla somente o Deus único e verdadeiro; nem lhe atribui coisa alguma que lhe ocorra à imaginação, mas se contenta com tê-lo tal qual Ele mesmo se manifesta, e com a máxima diligência sempre se acautela, para que não venha, mercê de ousada temeridade, a vaguear sem rumo, indo além dos limites de Sua vontade²”.
No desenvolver desta obra, pretendo manter-me fiel a uma das cinco solas sustentadas na reforma (não só a ela, mas principalmente a ela), “sola scriptura” - só as escrituras. Meu sincero desejo é honrar, servir e adorar a este Deus que se revelou a nós por meio de Sua infalível Palavra, e conduzir aos amados leitores a se prostrarem diante d’Aquele que vive e reina para todo o sempre. A Ele seja dada toda a glória para sempre amém.
Soli Deo Gloria!
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¹ TOZER, A. W., citado por Wiersbe, Warren W., Comentário Bíblico Expositivo, vol. V, pág. 329, Geográfica, 1ª edição, 6ª reimpressão, Santo André, SP, Brasil, 2012.
² CALVINO, João, As institutas da Religião Cristã, vol. I, Capítulo II pág. 51, doc. PDF.
Introdução do livro O Deus das Escrituras, de Patrick Antonio Rosa.